Quando era criança você já tapou os ouvidos para experimentar como seria a surdez ou a sensação de ouvir pouco?
Já usou isso para, numa conversa chata, fazer pirraça dizendo “não ouço nada”?
Agora estou plenamente habilitado — ou desabilitado? — a contar que mão no ouvido não chega nem perto da sensação absolutamente claustrofóbica de não mais ouvir sua própria respiração, pulsação… nem mesmo a própria voz!!
Pois não foi que dia 04 de novembro, vai fazer um mês depois de amanhã, acabei sendo premiado com um aprofundamento nessa experiência?
ME APRESENTO
Eu — surdo oralizado em português, inglês e espanhol — era controlador de tráfego aéreo e, por assim dizer, capaz de escutar até uma mosca voando do outro lado dos grossos vidros da torre: ia, como os pilotos, ao CEMAL anualmente na expectativa de ver aquela linha quase reta e lá no topo do exame de audiometria!
Aí vieram o transtorno ansioso depressivo com a síndrome do pânico que foram ampliados com os eventos da chamada “crise dos controladores” e, a despeito de meu seríssimo abalo psiquiátrico e suas consequências nefastas — alcancei 210Kg, episódios de gagueira, terror noturno, dores pelo corpo e, entre outros, o “recorde”: certo dia, ao chegar na torre soube que o major que me perseguia estava na unidade e atingi meu ápice de pressão arterial de 23×16! — fui tratado apenas como obeso.
Tentaram até me arrumar um problema cardíaco, mas após holters e MAPAS essa opção foi descartada e, por recomendação, entrei no grupo (que saudades…) e fui para a bariátrica.
Outro dia vou contar essas histórias com mais minúcias, mas mesmo após perder peso continuei apresentando todos os outros sintomas psiquiátricos e, infelizmente, a pressão feita involuntariamente pelo sistema militar acabou apenas impedindo a cura: após 20 longos anos de serviço fui reformado por incapacidade para o serviço militar, sem promoção e ganhando apenas 2/3 do soldo de 1º sargento.
O fato é que, não posso ocultar nem negar, creio em Deus e foi Ele quem colocou pessoas e atividades em minha vida que permitiram a preservação de meu casamento e de minha sanidade. Demorei uns dois anos até descobrir meu segredo para superar a depressão e, daí em diante, com a saúde em dia, seria só batalhar para complementar a renda…
Seria, mas não foi: um dia, vida saudável, estava correndo todo pimpão na esteira da academia quando — TLOC! — meu ouvido entupiu como se fosse aquela pressão que dá quando voamos de avião.
A SURDEZ
Fiz as manobras recomendadas, esperei por algumas horas e nada: era como se tivesse um travesseiro invisível tapando meus ouvidos.
Deve ser cera!
No dia seguinte acordei “tapado” e fui direto ao consultório do otorrinolaringologista que logo descartou essa hipótese e, após algumas perguntas, solicitou uma série de exames.
As perguntas realizadas foram bastante importantes, pois naquela época estava ocorrendo um estranho fenômeno: eu ficava tonto quando tomava café!
Esse e outros resultados levaram ao diagnóstico de perda neurossensorial bilateral de moderada a severa irreversível, provavelmente causada pela síndrome de Ménière e tendo como fator ototóxico ou a anestesia geral ou o Vioxx, medicamento indicado para recuperação após a gastroplastia.
Enfim, aquela audição de tuberculoso (da qual me orgulhava sem saber) nunca mais voltou e, pelo menos, a própria Força Aérea colaborou com uma parte na aquisição de minhas primeiras próteses auditivas que, por sinal, merecem um artigo a parte por conta de todos os erros que ocorreram, de sua aquisição até a completa ausência de ajustes, e os tornaram em acessórios praticamente inúteis: andei surdo e sem próteses até abril de 2016, quando fui convidado para ser gerente de um pavilhão dos jogos olímpicos e os geniais irmãos Fleming me proporcionaram (o que chamo de) um retorno ao mundo dos vivos… eu escutava até música!!!